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AS POLARIZAÇÕES NA POLÍTICA SÃO SEMPRE DESEJÁVEIS?

Se assim como eu, você também se sente desconfortável politicamente, mesmo em um cenário polarizado como é o atual no Brasil, saiba que a polarização na política já teve contornos mais dramáticos. Durante a Segunda Guerra Mundial, alguns países do leste foram invadido pela Alemanha nazista, e permaneceram sob o domínio de Hitler até que os Aliados derrotassem o exército alemão. Mas como fim da guerra, algumas nações não se viram livres da dominação estrangeira: poloneses e húngaros, por exemplo, tiveram que suportar, por décadas, regimes comunistas ligados à União Soviética.

Embora Hitler e Stálin tenham pactuado secretamente durante o conflito, o fato é que, do ponto de vista ideológico, nazistas e comunistas opunham-se. Ambas as doutrinas políticas protagonizaram, no século vinte, os maiores conflitos bélicos, causando também governos tirânicos sem precedentes históricos. Os nazistas perseguiram judeus e os assassinaram em câmaras de gás, após serem enviados a campos de concentração. Os comunistas perseguiram opositores ao regime, bem como grupos étnicos e religiosos específicos, enviando todos aos conhecidos gulags.

Mas para poloneses e húngaros, a oposição ideológica entre nazistas e comunistas não representava consolo suficiente. Se viver debaixo da autoridade nazista era uma situação repressora, estar cercado pelos muros do comunismo soviético significava viver em um cárcere. Nesse caso, a polarização deixava de ter grandes vantagens.

Recordo-me do romance Libertação, escrito pelo húngaro Sándor Marai, um dos meus autores prediletos. Assolados pelo combate entre nazistas e comunistas que então buscavam o domínio do território húngaro, os personagens refugiavam-se em um porão sem saber exatamente qual seria o destino. Ali se encontravam homens e mulheres de condição simples, tanto quanto famílias que ainda conservavam tradições do império austro-húngaro, e mesmo em uma circunstância inusitada, esforçavam-se por conservar as diferenças sociais.

Ainda que não seja a obra mais relevante de Sándor Marai, Libertação suscita questões importantes a respeito da condição humana e também da oposição de doutrinas políticas contrárias. Vencer um inimigo terrível, não representa necessariamente a liberdade. No caso específico, a derrota nazista ocasionou um regime ditatorial comunista que se perpetuou por décadas.

Vale manter esse fato em perspectiva quando o cenário político de um país torna-se não apenas polarizado, mas tende também a oferecer propostas que, de um modo ou de outro, impõe determinações excessivamente restritivas. Trocar uma ditadura por outra a pretexto de uma mudança ideológica não costuma ser uma ideia auspiciosa.


Gabriel Santamaria

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